segunda-feira, 27 de junho de 2011

Estudos Gerais, novo curso da Universidade de Lisboa

Muitos séculos depois, a Universidade de Lisboa recupera os Estudos Gerais, num tempo em que já podemos apercebermo-nos dos resultados a que conduzem as especializações prematuras por áreas do conhecimento, que deixam muitos praticamente desprovidos de ferramentas para compreenderem outras matérias, muito menos de as relacionarem com as que aprenderam. A licenciatura em Estudos Gerais, que se inicia no próximo ano lectivo, dá a cada aluno a possibilidade, à semelhança do que acontece nos Estados Unidos da América, de elaborar o seu próprio plano de estudos, escolhendo as matérias que deseja aprender, desde a Biologia, às Artes, à Filosofia, às Línguas, ou seja, um só curso abarca áreas tão diversas como as Artes, Ciências e Humanidades. Terminada esta licenciatura, os alunos ficarão, por certo, e com este modelo, mais apetrechados para escolherem as áreas em que querem especializar-se, através de cursos de pós-graduação, já para não falar na maturidade e no conhecimento de causa com que o fazem, muito diferente do que acontece no 9.º ano de escolaridade, que é quando agora têm de escolher a área a seguir no Secundário.

Deixo o que, no entender da Universidade de Lisboa, será a mais-valia deste curso:

«O curso de Estudos Gerais serve para as pessoas poderem ser capazes de estudar e perceber coisas diferentes: do Big Bang a Homero, das leis da perspectiva à filosofia política, das culturas multimedia às línguas orientais. Para não serem ignorantes em Biologia, em História, em Matemática ou em Arte. Para serem capazes de distinguir uma falácia de um argumento, explicar-se através de um desenho ou ler estatísticas.

Quem percebe coisas diferentes é mais capaz de fazer coisas diferentes. E quem é capaz de fazer coisas diferentes tem mais facilidade em encontrar emprego. Os empregadores vão poder encontrar nos licenciados em Estudos Gerais pessoas com formações mais completas e mais versáteis. Uma formação em Estudos Gerais vai aumentar muito a competitividade dos seus graduados num mercado de emprego global e em mutação constante. E, porque os nossos alunos vão organizar a sua formação superior de acordo com os seus interesses, a sua motivação irá também aumentar.

Para os que quiserem continuar a estudar depois da licenciatura, os Estudos Gerais darão acesso a todos os mestrados das Faculdades de Belas-Artes, Ciências e Letras da Universidade de Lisboa, bem como aos mestrados em ensino da Universidade, dependendo dos majors ou das disciplinas que tenham sido escolhidos no seu decurso.»

quinta-feira, 16 de junho de 2011

José Saramago, para recordar sempre

No próximo dia 18 de Junho completa-se um ano em que fiquei sem palavras, pela emoção e choque, ao saber da notícia da morte de José Saramago, embora ela fosse esperada, dado o seu estado de saúde.

Agora, com a serenidade que o passar do tempo ajuda a reencontrar, partilho convosco os convites que recebi da Fundação José Saramago, para os eventos que decorrerão nos dias 18 e 19 de Junho (Sábado e Domingo), em Lisboa.


A 18 de Junho, pelas 11:00 horas, no Campo das Cebolas, junto à Casa dos Bicos:

«A 18 de Junho, um ano depois da sua morte, as cinzas de José Saramago serão depositadas diante da Casa dos Bicos, frente ao rio Tejo, em Lisboa.

O Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, a Junta de Freguesia de Azinhaga e a Fundação José Saramago convidam V. Exa. para um acto que não será de despedida, porque há pessoas a quem não se pode dizer adeus.

No acto intervirão o professor e cantor lírico Jorge Vaz de Carvalho, que lerá "Palavras para uma Cidade", de José Saramago, e a escritora Lídia Jorge. Actuará a Orquestra de Percussão Tocá Rufar.

O Presidente da Câmara Municipal de Lisboa António Costa encerrará a cerimónia.»


A 19 de Junho, pelas 18:30 horas, no Grande Auditório do Centro Cultural de Belém:

«A Ministra da Cultura e a Fundação José Saramago convidam V. Exa. para o espectáculo "As Sete Últimas Palavras de Cristo na Cruz", com música de Joseph Haydn e textos de José Saramago.

Concepção de cena: Teresa Villaverde
Interpretação: Orquestra Sinfónica Portuguesa

Entrada livre sujeita à lotação da sala.
Os bilhetes podem ser levantados nos seguintes locais:
- Centro Cultural de Belém, diariamente, das 11 às 20 Horas;
- Cinema São Jorge, de Segunda a Sábado, das 13 às 19 Horas, até ao dia 18 de Junho.

PARA LEVANTAR BILHETES NÃO É NECESSÁRIO TER CONVITE

«Mas não subiu para as estrelas se à terra pertencia.»
José Saramago
1922-2010

sexta-feira, 10 de junho de 2011

António Barreto - Discurso no Dia de Portugal (10/06/2011)

Para quem não teve a possibilidade de ouvir hoje, em directo, o discurso de António Barreto nas comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, aqui fica na íntegra:

«Nada é novo. Nunca! Já lá estivemos, já o vivemos e já conhecemos. Uma crise financeira, a falência das contas públicas, a despesa pública e privada, ambas excessivas, o desequilíbrio da balança comercial, o descontrolo da actividade do Estado, o pedido de ajuda externa, a intervenção estrangeira, a crise política e a crispação estéril dos dirigentes partidários. Portugal já passou por isso tudo. E recuperou. O nosso país pode ultrapassar, mais uma vez, as dificuldades actuais. Não é seguro que o faça. Mas é possível.

Tudo é novo. Sempre! Uma crise internacional inédita, um mundo globalizado, uma moeda comum a várias nações, um assustador défice da produção nacional, um insuportável grau de endividamento e a mais elevada taxa de desemprego da história. São factos novos que, em simultâneo, tornam tudo mais difícil, mas também podem contribuir para novas soluções. Não é certo que o novo enquadramento internacional ajude a resolver as nossas insuficiências. Mas é possível.

Novo é também o facto de alguns políticos não terem dado o exemplo do sacrifício que impõem aos cidadãos. A indisponibilidade para falarem uns com os outros, para dialogar, para encontrar denominadores comuns e chegar a compromissos contrasta com a facilidade e o oportunismo com que pedem aos cidadãos esforços excepcionais e renúncias a que muitos se recusam. A crispação política é tal que se fica com a impressão de que há partidos intrusos, ideias subversivas e opiniões condenáveis. O nosso Estado democrático, tão pesado, mas ao mesmo tempo tão frágil, refém de interesses particulares, nomeadamente partidários, parece conviver mal com a liberdade. Ora, é bom recordar que, em geral, as democracias, não são derrotadas, destroem-se a si próprias!

Há momentos, na história de um país, em que se exige uma especial relação política e afectiva entre o povo e os seus dirigentes. Em que é indispensável uma particular sintonia entre os cidadãos e os seus governantes. Em que é fundamental que haja um entendimento de princípio entre trabalhadores e patrões. Sem esta comunidade de cooperação e sem esta consciência do interesse comum nada é possível, nem sequer a liberdade.

Vivemos um desses momentos. Tudo deve ser feito para que estas condições de sobrevivência, porque é disso que se trata, estejam ao nosso alcance. Sem encenação medíocre e vazia, os políticos têm de falar uns com os outros, como alguns já não o fazem há muito. Os políticos devem respeitar os empresários e os trabalhadores, o que muitos parecem ter esquecido há algum tempo. Os políticos devem exprimir-se com verdade, princípio moral fundador da liberdade, o que infelizmente tem sido pouco habitual. Os políticos devem dar provas de honestidade e de cordialidade, condições para uma sociedade decente.

Vivemos os resultados de uma grave crise internacional. Sem dúvida. O nosso povo sofre o que outros povos, quase todos, sofrem. Com a agravante de uma crise política e institucional europeia que fere mais os países mais frágeis, como o nosso. Sentimos também, indiscutivelmente, os efeitos de longos anos de vida despreocupada e ilusória. Pagamos a factura que a miragem da abundância nos legou. Amargamos as sequelas de erros antigos que tornaram a economia portuguesa pouco competitiva e escassamente inovadora. Mas também sofremos as consequências da imprevidência das autoridades. Eis por que o apuramento de responsabilidades é indispensável, a fim de evitar novos erros.

Ao longo dos últimos meses, vivemos acontecimentos extraordinários que deixaram na população marcas de ansiedade. Uma sucessão de factos e decisões criou uma vaga de perplexidade. Há poucos dias, o povo falou. Fez a sua parte. Aos políticos cabe agora fazer a sua. Compete-lhes interpretar, não aproveitar. Exige-se-lhes que interpretem não só a expressão eleitoral do nosso povo, mas também e sobretudo os seus sentimentos e as suas aspirações. Pede-se-lhes que sejam capazes, como não o foram até agora, de dialogar e discutir entre si e de informar a população com verdade. Compete-lhes estabelecer objectivos, firmar um pacto com a sociedade, estimular o reconhecimento dos cidadãos nos seus dirigentes e orientar as energias necessárias à recuperação económica e à saúde financeira. Espera-se deles que saibam traduzir em razões públicas e conhecidas os objectivos das suas políticas. Deseja-se que percebam que vivemos um desses raros momentos históricos de aflição e de ansiedade colectiva em que é preciso estabelecer uma relação especial entre cidadãos e governantes. Os Portugueses, idosos e jovens, homens e mulheres, ricos e pobres, merecem ser tratados como cidadãos livres. Não apenas como contribuintes inesgotáveis ou eleitores resignados. É muito difícil, ao mesmo tempo, sanear as contas públicas, investir na economia e salvaguardar o Estado de protecção social. É quase impossível. Mas é possível. É muito difícil, em momentos de penúria, acudir à prioridade nacional, a reorganização da Justiça, e fazer com que os Juízes julguem prontamente, com independência, mas em obediência ao povo soberano e no respeito pelos cidadãos. É difícil. Mas é possível.

O esforço que é hoje pedido aos Portugueses é talvez ímpar na nossa história, pelo menos no último século. Por isso são necessários meios excepcionais que permitam que os cidadãos, em liberdade, saibam para quê e para quem trabalham. Sem respeito pelos empresários e pelos trabalhadores, não há saída nem solução. E sem participação dos cidadãos, nomeadamente das gerações mais novas, o esforço da comunidade nacional será inútil.

É muito difícil atrair os jovens à participação cívica e à vida política. É quase impossível. Mas é possível. Se os mais velhos perceberem que de nada serve intoxicar a juventude com as cartilhas habituais, nem acreditar que a escola a mudará, nem ainda pensar que uma imaginária "reforma de mentalidades" se encarregará disso. Se os dirigentes nacionais perceberem que são eles que estão errados, não as jovens gerações, às quais faltam oportunidades e horizontes. Se entenderem que o seu sistema político é obsoleto, que o seu sistema eleitoral é absurdo e que os seus métodos de representação estão caducos.

Como disse um grande jurista, “cada geração tem o direito de rever a Constituição”. As jovens gerações têm esse direito. Não é verdade que tudo dependa da Constituição. Nem que a sua revisão seja solução para a maior parte das nossas dificuldades. Mas a adequação, à sociedade presente, desta Constituição anacrónica, barroca e excessivamente programática afigura-se indispensável. Se tantos a invocam, se tantos a ela se referem, se tantos dela se queixam, é porque realmente está desajustada e corre o risco de ser factor de afastamento e de divisão. Ou então é letra morta, triste consolação. Uma nova Constituição, ou uma Constituição renovada, implica um novo sistema eleitoral, com o qual se estabeleçam condições de confiança, de lealdade e de responsabilidade, hoje pouco frequentes na nossa vida política. Uma nova Constituição implica um reexame das relações entre os grandes órgãos de soberania, actualmente de muito confusa configuração. Uma Constituição renovada permitirá pôr termo à permanente ameaça de governos minoritários e de Parlamentos instáveis. Uma Constituição renovada será ainda, finalmente, o ponto de partida para uma profunda reforma da Justiça portuguesa, que é actualmente uma das fontes de perigos maiores para a democracia. A liberdade necessita de Justiça, tanto quanto de eleições. Pobre país moreno e emigrante, poderás sair desta crise se souberes exigir dos teus dirigentes que falem verdade ao povo, não escondam os factos e a realidade, cumpram a sua palavra e não se percam em demagogia!

País europeu e antiquíssimo, serás capaz de te organizar para o futuro se trabalhares e fizeres sacrifícios, mas só se exigires que os teus dirigentes políticos, sociais e económicos façam o mesmo, trabalhem para o bem comum, falem uns com os outros, se entendam sobre o essencial e não tenham sempre à cabeça das prioridades os seus grupos e os seus adeptos.

País perene e errante, que viveste na Europa e fora dela, mas que à Europa regressaste, tens de te preparar para viver com metas difíceis de alcançar, apesar de assinadas pelo Estado e por três partidos, mas tens de evitar que a isso te obrigue um governo de fora.

País do sol e do Sul, tens de aprender a trabalhar melhor e a pensar mais nos teus filhos.

País desigual e contraditório, tens diante de ti a mais difícil das tarefas, a de conciliar a eficiência com a equidade, sem o que perderás a tua humanidade. Tarefa difícil. Mas possível.»

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Paulinho, afinal o que é que o menino quer?

Estava já a estranhar a manifestação de tanta ponderação, tanto juízo, tanto bom senso, em Paulo Portas, mas atribuí o facto a uma mais-valia da idade, não deixando, contudo, de manter aquela quota de desconfiança necessária, e que me é muito útil, porque me impede de seguir o canto de qualquer sereia que se atravesse no caminho. Por isso, hoje, quando afirmou que não estaria muito interessado em fazer parte de um futuro governo, mas, antes, em apoiá-lo com base num acordo parlamentar, contrariando o que tinha vindo a sugerir até agora, não me surpreendeu por completo. E isso trouxe-me à memória o verdadeiro Paulo Portas, aquele que tem muita dificuldade em partilhar, em delegar, poder.
Lembro-me que, qualquer presidência do CDS-PP, que não fosse a dele, tinha sempre o caminho armadilhado. Não admira, por isso, que ele seja o presidente de um partido que se mantém nessas funções há mais tempo. Ou seja, o partido é ele e ele é o partido. Ora, Portugal não é um partido, nem de um partido, nem sequer de um governo. Mas, e dadas as características da verdadeira personalidade de Paulo Portas que, de vez em quando, espreitam, talvez ele só se sentisse feliz e realizado se, num governo, fosse ministro de todos os ministérios e, por que não, e já agora, acumular tudo isso com o cargo de primeiro-ministro.
Eu, que tenho ouvido e lido tanta idiotice nesta campanha eleitoral, permito-me publicar este texto com a minha quota-parte da dita. E haja paciência...