sábado, 21 de agosto de 2010

Todos diferentes, todos diferentes - texto de Rodrigo Tavares

Quando nos questionamos sobre o destaque que algumas notícias e eventos têm e outros que se nos apresentam como de importância igual ou superior são omitidos, talvez este texto de Rodrigo Tavares, Todos diferentes, todos diferentes, publicado na passada quinta-feira na Visão, nos ajude a reflectir sobre as causas para que tal aconteça. Só é pena estar escrito num arremedo de português.

Rodrigo Tavares
11:53 Quinta feira, 19 de Ago de 2010

Quem lê diariamente vários jornais internacionais deteta com facilidade que são poucas as variações no texto. As manchetes são iguais no Japão ou na Islândia. Os românticos do jornalismo interventivo e empírico, como Ryszard Kapuscinski, deram lugar às agências internacionais. As notícias deram lugar aos press-releases. A informação que nos chega é muitas vezes granítica, fechada, e unilateral.
Isto tem várias consequências perniciosas. Como são poucos os produtores de notícias, existe uma tendência para dar prioridade aos mesmos assuntos. A agenda é monopolizada pelas mesmas vontades. A notícia de um avião que se despenhe no Botswana terá mais relevância no vizinho Zimbabué do que no Equador. Faz sentido. Mas porque é que um derramamento de petróleo no Golfo do México, nos EUA, tem que algemar as notícias ao longo dos últimos meses, enquanto um derramamento de petróleo no Delta do Níger, na Nigéria, é ignorado? O primeiro durou 4 meses e afetou algumas centenas de pessoas, o segundo, dura silenciosamente há 50 anos e afeta milhões.
Ao mesmo tempo que começamos a sentir um impulso pela nacionalização do outro, pela vontade de extravasarmos o nosso reduto cultural, são as notícias que ditam quem tem valor e quem não tem. Elas são os novos juízes do purgatório. Um africano tem menos valor do que um europeu. Um asiático tem menos valor do que um americano. Enquanto escrevo, as cheias no Paquistão já afetaram 20 milhões de pessoas. É a maior catástrofe do género. Mas a cobertura jornalística é incomparavelmente inferior às cheias em Nova Orleães em 2005.
Talvez o melhor exemplo do desequilíbrio na agenda da imprensa internacional seja o conflito israelo-palestiniano. Basta alguém lançar um cocktail molotov em Telavive para ser destaque a nível mundial. Mas todos os dias morrem centenas de pessoas em outros conflitos sem qualquer cobertura mediática. Como me disse um dia ao almoço, de forma sarcástica, um premiado correspondente de guerra indiano, a única razão porque ainda não há paz no Médio Oriente é porque demasiados jornalistas estão acreditados na região. Telavive é a segunda cidade do mundo com maior número de jornalistas estrangeiros (depois de Washington). E existe uma forte pressão para transformar "eventos" (mesmo que irrelevantes) em "notícias". Nas eleições palestinianas de 2006, testemunhei jornalistas estrangeiros manipulando crianças de forma a industrializar manchetes. Eu não descuro a complexidade do conflito no Médio Oriente. Mas é interessante reparar que esse conflito causa menos vítimas anuais do que os acidentes de viação em Portugal. A narrativa do conflito, alimentada pelas agências de notícias, torna irracional a nossa perceção da realidade.
Os desequilíbrios dos media também afetam a agenda política e humanitária. A disponibilidade de um país em ajudar uma nação atingida por uma catástrofe natural é proporcional à pressão mediática para o fazer. O problema é que as agências de notícias movem-se, muitas vezes, por interesses comerciais. Mas os estados é suposto regerem-se por outro tipo de princípios. É por isso importante estar atento à exceção, ao inoportuno, à alternativa. É aí que reside o novo jornalismo. E a nova política.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Dia Mundial da Ajuda Humanitária

No ano passado, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), proclamou o dia 19 de Agosto como Dia Mundial da Ajuda Humanitária para assinalar o ataque de 19 de Agosto de 2003 contra o Hotel Canal em Bagdade, o qual causou a morte a 22 membros do pessoal das Nações Unidas, incluindo o então chefe da sua missão no Iraque, Sérgio Vieira de Mello, e fez mais de 150 feridos.
Em 2009 foram mortos, sequestrados ou gravemente feridos, em consequência de ataques, 260 trabalhadores humanitários, o número mais elevado de sempre e, quando se fizerem as contas no final deste ano, certamente que o número continuará a ser inaceitável tanto para quem ajuda como para quem é ajudado,  já que os ataques, suicidas ou não, continuam a verificar-se quase todos os dias, quer no Iraque, quer no Afeganistão onde ontem, num  ataque suicida em Cabul, foram mortos dois funcionários afegãos da ONU juntamente com outras sete pessoas.
Sendo os trabalhadores humanitários também veículos de conhecimento, designadamente sobre os direitos humanos fundamentais, têm vindo a tornar-se, também por isso, em alvos a abater quando tentam ajudar em sociedades em que os cidadãos não têm quaisquer direitos.
Homenageio assim todos os trabalhadores humanitários, os que continuam no terreno e os que deram a vida tentando melhorar a vida dos outros.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010