Não vou pedir aos deputados, e aos cidadãos em geral, que leiam a Ética Prática de Peter Singer. Por isso deixo aqui alguns excertos para leitura atenta e reflectida, pode ser que ajude a alterar discursos partidarizados quando, do que se trata, é precisamente do domínio ético-filosófico. Já o tinha feito em 2009, mas agora parece que a capacidade de retenção de conhecimento diminuiu drasticamente por contraponto ao aumento da vozearia desprovida de sentido.
P. 20
…O comportamento ético não exige a crença no céu e no inferno.
Peter Singer, Ética Prática, Gradiva, Lisboa, 1.ª edição, 2000 (original 1993)
P. 20
…O comportamento ético não exige a crença no céu e no inferno.
P. 94
O facto de um ser ter consciência de si
confere-lhe alguma forma de prioridade na consideração dos seus interesses?
P. 147
Não arranjamos dores de cabeça apenas para
podermos tomar uma aspirina e satisfazer assim o nosso desejo de nos
libertarmos da dor.
P. 166
Um ser só se pode considerar vítima quando
tenha interesses que são violados.
P. 196 e seguintes
Eutanásia, significa “uma morte serena e
pacífica”.
Tipos de eutanásia: voluntária, involuntária,
não voluntária.
Voluntária – a pedido da pessoa que deseja
morrer (pouco se distingue do suicídio assistido)
Involuntária – não se pergunta à pessoa se
deseja morrer, e, apesar do seu sofrimento atroz, muitas vezes deseja continuar
a viver se lhe perguntarem (caso de bebés com graves deformações ou adultos
com deficiências mentais graves desde o nascimento).
Não voluntária – a pessoa não é capaz de
compreender a escolha entre a vida e a morte e não deixou expresso nada nesse
sentido.
Pessoa = ser humano autoconsciente, racional e
autónomo.
Estado vegetativo = seres vivos biologicamente
mas não biograficamente.
P. 213
De que modo as questões éticas são diferentes
quando um ser é capaz de consentir e de facto o faz?
P. 220
John Stuart Mill pensava que o Estado nunca
devia interferir com o indivíduo, excepto para impedir danos a terceiros. O bem
individual, pensava Mill, não representa uma razão adequada à intervenção do
Estado. Mas Mill pode ter tido uma opinião demasiado elevada da racionalidade
do ser humano. Pode ser ocasionalmente um bem evitar que as pessoas façam
escolhas que obviamente não se baseiam na racionalidade e que podemos ter a certeza
de que mais tarde se irão lamentar. No entanto, a proibição da eutanásia
voluntária não se pode justificar com bases paternalistas, pois a eutanásia
voluntária é um acto para o qual há boas razões. A eutanásia voluntária só
ocorre quando, tanto quanto a medicina sabe, uma pessoa sofre de uma doença
incurável e dolorosa ou extremamente penosa. Nessas circunstâncias não se pode
dizer que optar por uma morte rápida seja obviamente irracional. A força da
argumentação em favor da eutanásia voluntária reside na sua combinação de
respeito pelas preferências ou autonomia daqueles que se decidem pela eutanásia
e na base racional inequívoca da própria decisão.
P. 229
Por que motivo é um mal matar, mas deixar
morrer não é?
Não existe qualquer diferença moral intrínseca
entre matar e deixar morrer (entre agir e omitir).
P. 236
Se os actos de eutanásia só puderem ser
praticados por pessoal médico, não é provável que a propensão para matar
alastre descontroladamente por toda a comunidade. Os médicos já têm um poder
considerável sobre a vida e a morte, por intermédio da possibilidade de
suspenderem o tratamento. Nunca se aventou que os médicos que começam por
deixar que os bebés com deficiências profundas morram de pneumonia possam
passar a deixar de administrar antibióticos a minorias raciais ou a extremistas
políticos. De facto, legalizar a eutanásia poderia muito bem limitar o poder
dos médicos, visto que traria para a luz do dia e sujeitaria ao escrutínio de
outro médico aquilo que alguns médicos fazem por iniciativa pessoal e em
segredo.
P. 246
Se um médico decidir, em consulta com os pais,
não operar um bebé com síndrome de Down e obstrução intestinal (deixando-o,
assim, morrer), a sua motivação será semelhante à do médico que lhe dá uma
injecção letal em vez de deixar o bebé morrer. Em nenhum dos casos é necessário
qualquer heroísmo moral. Não operar porá fim à vida com tanta certeza como uma
injecção letal. Deixar morrer tem, de facto, uma vítima identificável. (…) As
diferenças extrínsecas que normalmente demarcam a morte provocada do deixar
morrer explicam o facto por que razão, normalmente, achamos que matar é bem
pior que deixar morrer.
P. 317 (Ética e Lei)
Temos alguma obrigação moral de obedecer à lei
quando a lei protege e sanciona coisas que achamos totalmente erradas?
Filósofo Robert Paul Wolff: “A marca
definidora do Estado é a autoridade, o direito de governar. A primeira
obrigação do homem é a autonomia, a recusa em ser governado. Poderia parecer,
então, que não há solução para o conflito entre a autonomia do indivíduo e a
suposta autoridade do Estado. Enquanto o homem cumprir a sua obrigação de ser o
autor das suas decisões resistirá à pretensão do Estado de ter autoridade sobre
si.”
Henry Thoreau, Civil Disobedience, século XIX:
“Terá o cidadão de entregar a sua consciência ao legislador, nem que seja por
um só momento ou no grau mínimo? Para que terá então todo o homem uma
consciência? Penso que devemos ser em primeiro lugar homens e só depois
súbditos. Não é desejável cultivar o respeito pela lei nem pelo direito. A
única obrigação que tenho o direito de assumir é a de fazer sempre aquilo que
penso ser justo.”
Atenção: a ética requer imperativos racionais e
universais.
P. 374
Qual é a importância moral da distinção entre
provocar a morte de um paciente, retirando-lhe o tratamento necessário ao
prolongamento da vida, e provocá-la por meio de uma intervenção activa?
P. 381
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