quarta-feira, 15 de outubro de 2008

A utilidade das crises

Podemos considerar as crises como momentos importantes em qualquer aspecto das nossas vidas, pessoais e colectivas, porque nos dão a oportunidade de separar o trigo do joio. Uma crise não se manifesta nem se instala quando estamos atentos às implicações do que fazemos e do que dizemos, ou seja, quando cada um age à luz da ética e da deontologia.
Sem "krisis", no sentido grego do termo, não haveria julgamento, debate, comparação, escolha, decisão, desfecho, ruptura, e, portanto, a oportunidade de elaborar novas regras, mais rigorosas, em que assentem os nossos actos futuros. Por outras palavras, as crises obrigam-nos a fazer balanços do que fizemos de certo e de errado para, de forma esclarecida, evitarmos replicar esses mesmos erros e, idealmente, não cometermos outros.
Existe na língua portuguesa a expressão "passar pelo crivo" que encerra, precisamente, a ideia de avaliação de algo ou de alguém face a determinados valores com o objectivo de separar o certo do errado, o bom do mau, o competente do incompetente, o responsável do irresponsável. o tal trigo do joio.
Se, na presente crise, formos capazes de fazer um balanço profundo e exaustivo e dele saírem normas rigorosas e transparentes para os sectores que a provocaram, bem como a identificação de outras possíveis fragilidades, mais depressa desaparecerão a desconfiança e a perplexidade, a depressão e a angústia, caso contrário, voltaremos à aparência de normalidade, a uma normalidade podre.
Quando se bate no fundo, só há um caminho a percorrer: o da subida, mesmo aos solavancos. Permanecer no fundo não é opção nem se adequa ao significado do termo "crise" que não é mais do que "oportunidade para reflectir e romper com situações danosas".

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Utopia Pessoana para a Europa

(...)
"A Europa tem sede de que se crie, tem fome de Futuro!
A Europa quer grandes Poetas, quer grandes Estadistas, quer grandes Generais!
Quer o Político que construa conscientemente os destinos inconscientes do seu Povo!
Quer o Poeta que busque a Imortalidade ardentemente, e não se importe com a fama, que é para as actrizes e para os produtos farmacêuticos!
Quer o General que combata pelo Triunfo Construtivo, não pela vitória em que apenas se derrotam os outros!
A Europa quer muitos destes Políticos, muitos destes Poetas, muitos destes Generais!
A Europa quer a Grande Ideia que esteja por dentro destes Homens Fortes - a ideia que seja o Nome da sua riqueza anónima!
A Europa quer a Inteligência Nova que seja a Forma da sua Matéria caótica!
Quer a Vontade Nova que faça um Edifício com as pedras-ao-acaso do que é hoje a Vida!
Quer a Sensibilidade Nova que reúna de dentro os egoísmos dos lacaios da Hora!
A Europa quer Donos! O Mundo quer a Europa!
A Europa está farta de não existir ainda! Está farta de ser apenas o arrabalde de si-própria! A Era das Máquinas procura, tacteando, a vinda da Grande Humanidade!
A Europa anseia, ao menos, por Teóricos de O-que-será, por Cantores-Videntes do seu Futuro!
Dai Homeros à Era das Máquinas, ó Destinos científicos! Dai Miltons à Época das Cousas Eléctricas, ó Deuses interiores à Matéria!
Dai-nos Possuidores de si-próprios, Fortes, Completos, Harmónicos, Subtis!
A Europa quer passar de designação geográfica a pessoa civilizada!
O que aí está a apodrecer a Vida, quando muito é estrume para o Futuro!
O que aí está não pode durar, porque não é nada!
Eu, da Raça dos Navegadores, afirmo que não pode durar!
Eu, da Raça dos Descobridores, desprezo o que seja menos que descobrir um Novo Mundo!
Quem há na Europa que ao menos suspeite de que lado fica o Novo Mundo agora a descobrir? Quem sabe estar em um Sagres qualquer?
Eu, ao menos, sou uma grande Ânsia, do tamanho exacto do Possível!
Eu, ao menos, sou da estatura da ambição Imperfeita, mas da Ambição para Senhores, não para escravos!
Ergo-me ante o sol que desce, e a sombra do meu Desprezo anoitece em vós!
Eu, ao menos, sou bastante para indicar o Caminho!"

Excerto de "Ultimatum", Fernando Pessoa (Álvaro de Campos), 1917

terça-feira, 7 de outubro de 2008

A sorrir também se aprende

Vejam o vídeo alojado neste endereço e aprendam um pouco mais sobre as origens da actual crise financeira, o "subprime" e muitas outras coisas, sem deixar de sorrir: http://www.invertired.com/quimu/videos/25/34.
Não foi a Daphne du Maurier que, em 1972, escreveu um livro intitulado "A sorrir também se vence (Rule Britannia)" onde mostra que o humor pode ser uma arma? Está-lhes no sangue.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Juros e juros

O que sentirão as pessoas que não devem um cêntimo a quem quer que seja e que têm as suas poupanças, ao ouvir este matraquear diário àcerca das pessoas endividadas, sobre-endividadas, a quem toda a gente quer ajudar e ensinar a gerir o seu dinheiro, desde a DECO até à Câmara de Lisboa (no caso desta parece anedota), porque a taxa de juro de referência do BCE de vez em quando sobe e as taxas aplicadas pelos Bancos comerciais não param de subir, enfim, a ladainha sempre igual, todos os dias, de há um ano a esta parte? Ora, essas pessoas, as tais que não devem um cêntimo, gostariam de gritar bem alto que acham as taxas de juro muito baixas, que gostariam de ver as suas poupanças remuneradas de outro modo, quem sabe às taxas de 20% e 30% de que tantos ainda se lembram, mas não podem manifestar esse desejo porque os outros, os endividados, que não são mais do que pessoas irresponsáveis e/ou ignorantes, linchá-las-iam, pensando, talvez, tratar-se de seres malignos. Se ser-se honesto, responsável, culto, sensato é visto, actualmente, como uma anomalia, o que é que esperávamos?