Acalmada a histeria jornalística sobre o gesto de Manuel Pinho, vamos ao assunto. Ontem ouvi o debate do estado da Nação como é hábito, através de rádio, de modo que, no momento do famigerado gesto, do que não gostei foi que a TSF se tenha dedicado completamente ao mesmo em vez de me permitir ouvir em directo o orador que estava no uso da palavra, e mudei para a Antena 1 onde, apesar de uma interrupção ou outra da Maria Flor Pedroso para explanar sobre o que lhe parecia ser o "estado de espírito" do Primeiro Ministro, lá consegui ouvir quem estava a falar. Não fui para a sala da Televisão para ver o gesto. Depois de ter ouvido as declarações de Bernardino Soares, a quem o gesto foi dirigido, e os demais líderes dos grupos parlamentares, e quando o Ministro das Finanças era já o novo Ministro da Economia em acumulação de pastas, é que vi o gesto. Francamente, não vi um gesto ofensivo, vi um gesto inócuo.
Os gestos têm significados! Por exemplo, se fizermos a um australiano aquele gesto que nós interpretamos como de vitória (mão fechada e com os dedos indicador e médio em forma de V) é para o australiano um insulto, pois corresponde ao que em Portugal se pretende dizer quando se fecha a mão e se deixam levantados os dedos indicador e mindinho, quer se coloque a mão junto à testa ou não, e é este o gesto que pode ser interpretado como insulto à esposa/o ou namorada/o da pessoa a quem é dirigido.
O gesto de Manuel Pinho (os indicadores de ambas as mãos junto à testa), interpreto-o como querendo dizer que Bernardino Soares e o PCP, à semelhança dos touros que avançam para qualquer pano vermelho que se agite à sua frente, assim avançam eles com comentários ou gestos impertinentes sempre que se abordam assuntos de áreas que eles consideram sua pertença, no caso, as minas de Aljustrel, ou seja, sempre que um tema se torna algo de obsessivo para o PCP estes reagem do mesmo modo que um touro face ao pano vermelho, numa atitude quase pavloviana.
Lembro-me quando Jaime Gama chamou Bocassa a Alberto João Jardim e quando um deputado do PSD proferiu palavrões em discussão acesa com um deputado do PS, tudo isto na Assembleia da República, e nada aconteceu! Na mesma "casa onde o povo deveria ser representado com toda a dignidade" de que agora todos se lembraram. Por que é que um gesto inócuo é valorizado e dele são retiradas todas as consequências e os palavrões, a gritaria e atitudes desrespeitosas como a de Paulo Rangel face ao Presidente da Assembleia da República neste mesmo debate, não o são?
É verdade que Manuel Pinho não é um político profissional, por isso não tem estômago para aturar tudo e mais alguma coisa. Mas estou constantemente a ouvir dizer mal dos políticos profissionais, que seria bom que houvesse mais pessoas independentes dos aparelhos partidários em cargos políticos, que tivessem mostrado competência nas suas áreas profissionais no sector privado, etc. Então em que ficamos?
Os jornalistas queriam circo e fizeram tudo para o ter. O Primeiro Ministro agiu muito bem ao resolver o problema de imediato.
1 comentário:
Concordo com algumas das coisas que diz. A questão da histeria jornalística que se faz, à volta deste tipo de assuntos, é, de facto, de proporções ridículas. O interesse de salientar determinadas situações, em detrimento de outras, também sabemos que é comum. Os problemas realmente importantes acabam sempre por ser relegados para 2.º plano.
A história está cheia de obras importantes feitas por pessoas que serão sempre lembradas, não pelo que fizeram de positivo, mas por deslizes, gestos, palavras que, em poucos segundos, arrasam anos e anos de trabalho.
Mas a verdade é que, tanto o ex-ministro, como o PM, como todos nós, também sabemos disso. E é por essa razão que, apesar dos actos irreflectidos que todos nós cometemos, aquele gesto não poderia ter sido feito.
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